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quinta-feira, 7 de abril de 2011

Conto - O segredo da Caixa

Conto de minha autoria devidamente registrado.

 
Foto By Regys Só para ilustrar o tópico
Estava um frio de lascar naquela manhã. Todos dentro de casa estavam encolhidos nas suas camas cobertos até os dentes com mantas e cobertores. Todos menos Marcos. Estar frio não era motivo para impedir que Marcos estivesse perambulando sem sapatos pela sala enrolado em seu cobertor. Ele era tão pequeno e magro que certamente teria passado desapercebido se não fosse a cor vermelho fogo de seus cabelos e a pele tão branca que mais parecia um fantasma saído de um conto de terror. Era muito parecido com a mãe, muito mais do que com o pai, deste somente herdara o nariz com uma ponta tão gordinha que mais parecia uma cereja quando ficava vermelha como nesta manhã.

Andava pela sala quando algo chamou sua atenção. Pela janela era possível ver uma pickup estacionada em frente a garagem do vizinho que morava na casa do outro lado da rua. Uma casa antiga - bem mais antiga do que a que Marcos morava. Tinha uma varandinha entulhada de plantas ressecadas pelo frio, dois andares e um telhado que tinha uma chaminé que soltava uma fumaça branca que se misturava com a neblina fraquinha daquela manhã. Uma típica casa da serra.

Na pickup havia várias caixas de papelão enormes sendo levadas por dois homens para dentro da garagem. Não seria nada de anormal se não fosse a coisa que chamou a atenção de Marcos. Um homem beeeeeem pequeno, quase um anão estava parado ao lado da pickup e segurava uma caixa aparentemente de madeira recoberta de algum material que reluzia como se fosse uma concha. Era muito bonita e pequena. Que teria dentro dela? Não preciso nem dizer que aquilo foi o suficiente para fazer com que Marcos colasse o rosto no vidro para ver melhor e prestar a máxima atenção nos passos do homenzinho até que ele entrasse também na casa e desaparecesse de vez.




O resto das coisas da pickup foram devidamente descarregadas e a pickup foi embora deixando o homenzinho e a caixa. E com isso, Marcos já tinha babado todo o vidro pelo lado de dentro de tanta curiosidade.

Nada mais aconteceu durante quase meia hora, até que o homenzinho saiu calmamente da casa, atravessou a rua e olhou diretamente para Marcos que continuava olhando pela janela. Ainda deu uma piscadela para o garoto e sorrindo foi-se embora rua abaixo, deixando o Marcos com os cabelos em pé. Certamente, sua indiscrição fora percebida. E detalhe, o homenzinho se foi e deixou a caixa.

Depois disso, os dias passaram, os meses se passaram e nada mais aconteceu na casa do outro lado da rua. Apenas a mesma senhora que mudara meses antes do dia que a pickup chegara com as caixas de papelão e a caixa misteriosa que o homenzinho trouxera consigo. Aparecia pela manhã saindo para comprar pão ou umas ou outras saídas pela rua mais pelo final da tarde. Nunca recebia ninguém. Aliás, isso também era curioso porque a casa de Marcos tinha uma frequência incrível de parentes e amigos, que era de impressionar a qualquer um naquele pacato condomínio. Enfim, nada de anormal. Além da caixa misteriosa que o homenzinho deixara com aquela senhora.

Depois de mais alguns meses, bem próximo do aniversário de 13 anos de Marcos, o homenzinho retornara a casa da senhora e, para variar um pouco, Marcos desta vez estava no jardim brincando com um videogame e novamente teve que olhar para a casa do outro lado da rua. Aliás, para o homenzinho que entrava na casa do outro lado da rua. Depois de quase meia hora, lá estava o homenzinho com a caixa nas mãos saindo pelo portão. Ainda deu outra olhada para o Marcos e novamente sorriu. Seguiu rua abaixo no mesmo passo miúdo e desapareceu na esquina. Desta vez, Marcos já se pendurara no muro e quase morreu do coração ao perceber que o homenzinho levara a caixa consigo deixando para trás o mistério. Ou seria a curiosidade de Marcos? Enfim, nada mais aconteceu durante muito tempo, diria até que tempo suficiente para que nem de longe passasse pela cabeça de Marcos que um dia houvera um homenzinho que dirá uma caixa misteriosa que só Deus e o homenzinho sabiam o que continha.

Porém, um belo dia de sol, quando Marcos estava para completar seus 15 anos de idade, a campainha tocou na porta da frente e arrancou Marcos do gibi em que ele estava mergulhado há pelo menos uma hora. Adivinhe quem era? Uhm? Claro, o homenzinho. E sabe mais o que? Ele trazia a caixa nas mãos.

Marcos ficou em choque vendo a mãe atendendo o homem. Trocaram umas palavras, a mãe de Marcos riu alegremente, deu uma olhada para Marcos quando o homenzinho fez um sinal com o queixo apontando para Marcos. Ficaram alguns minutos trocando uma conversa tão baixa que nem de onde estava, Marcos foi capaz de ouvir uma letra sequer. Logo depois, o homenzinho entregou a caixa para a mãe de Marcos e se despediu educadamente. E, novamente sorriu para Marcos dando uma piscadela.

Aquilo seria demais! Marcos e a caixa dentro da mesma casa, iria certamente dar o que falar em breve. Se você tem certeza de que Marcos iria mexer na caixa, pode tirar seu cavalinho da chuva, porque a primeira coisa que a mãe dele disse foi clara e pausadamente "Não mexa na caixa!".  O que acabou com qualquer breve idéia que tenha passado pela cabeça de Marcos naquele momento em que estava fixado no pequeno e reluzente objeto.

Seguindo mais um pouco com a história, obviamente que a mãe colocara a caixa dentro da cristaleira na sala e isso foi um suplício para Marcos, pois todos as vezes que passava pela sala olhava para o objeto secreto e intocável que pousava atrás dos vidros do móvel da sala. Tormento sem precedentes. E assim foi. A semana passou e a curiosidade de Marcos aumentou. A sua também pelo visto, aliás, a nossa.

Daí, no dia do aniversário de Marcos, logo pela manhã, já havia uma grande movimentação na casa, afinal iria rolar um churrasco de comemoração e todos iam e vinham pela sala onde ficava a caixa. Objeto secreto e intocável. E, não se sabe bem o por quê, um curto circuito provocou um incêndio sem precedentes no condomínio. Foi uma tremenda correria. Bombeiros para um lado, gente correndo para outro. Marcos e a caixa. A caixa e Marcos. A caixa queimando. Desespero. Nem posso dizer como Marcos ficou quando descobriu que tudo tinha se queimado na sala - e isso incluía a caixa secreta, objeto intocável e que Marcos jamais saberia seu conteúdo.

Porém, não se desespere também, essa história não vai terminar aqui.

Bom, depois da tragédia que destruiu parte da casa de Marcos, sua família se mudou para o centro da cidade. Longe do condomínio que pegou fogo. Afinal foram mais de dez casas incendiadas. Uma loucura. A nova casa de Marcos era bem pertinho da igreja que ficava na pracinha principal e onde a vida seria mais agitada com certeza. O tempo passou e um belo dia do nada, Marcos andava pela praça - já com seus 18 anos - e encontrou quem? Claro, o homenzinho. E qual não foi sua surpresa quando o homenzinho veio falar com ele. Marcos ficou em choque. Lembrou, homenzinho e caixa. Caixa e homenzinho. E logo Marcos que já tinha até esquecido da caixa, do homenzinho, de tudo o mais depois do incêndio.

Não se pode dizer que foi um "diálogo" porque em um rompante Marcos foi logo dizendo "O que tinha dentro daquela caixa?" O homenzinho pego de surpresa ficou com aquela cara de bolinho, quando a pessoa não tem a menor idéia do que o outro está falando. Deu duas piscadelas e olhando para Marcos perguntou "Caixa? Que caixa?". E Marcos foi logo dizendo "Aquela caixa que você entregou para a senhora do outro lado da minha rua e depois levou para a minha mãe guardar e pegou fogo junto com a sala".

Mais um momento de silêncio que o homenzinho franziu as sobrancelhas, deu uma pigarreada de leve e, depois como se tivesse tendo um momento de gênio e fosse gritar Eureca, ele disse "Ahh, a caixa de madrepérolas". E, Marcos fixou os olhos na boca do homenzinho como se fosse capaz de ler as palavras antes das mesmas serem pronunciadas. Assim como você lendo este conto. Enfim, depois de uma outra pausa ele disse "Era a caixa da quermesse da igreja. Tinha um escapulário centenário que o padre daqui gosta de deixar na casa dos fiéis que assim o desejam. Foi recuperado, meio chamuscado, mas inteirinho."

Inacreditável. Marcos ficou tanto tempo curioso com um simples objeto que não dava para acreditar que fosse apenas isso. Nenhum mapa secreto de um tesouro. O homenzinho não era um duende que entregava um pote de ouro em forma de caixinha. E o pior, a curiosidade com relação a caixa tomara muitas noites de seu sono. Não valera a pena.

Porém, rendeu uma boa história. E neste conto, a curiosidade não matou o curioso!
 
 
 

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